terça-feira, 8 de abril de 2014

A Verdade sobre o Caso Fungota


NOTA DA PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE ARARAQUARA


Em face das notícias aterrorizantes veiculadas pelo Município de Araraquara acerca do caso Gota de Leite, a Promotoria informa:

1. A ação civil pública movida pela Promotoria de Justiça do Patrimônio Público e Social de Araraquara (Ministério Público Estadual) no “Caso Gota de Leite” envolve, em tese,  graves atos de improbidade administrativa praticados desde a reinauguração da maternidade (março de 2012). Não está baseada apenas em notícias trazidas por vereadores do PT. É resultado de uma investigação que durou 7 (sete) meses e que revelou situações sequer cogitadas pelos autores da representação.

2. A liminar requerida pelo MP, concedida pelo Juiz da Vara da Fazenda Pública, Dr. Humberto Isaías Gonçalves Rios, não tem por finalidade a paralisação das atividades da maternidade. Pretende-se apenas impedir que terceiros se enriqueçam à custa do dinheiro público.

3. Para buscar uma solução que concilie a legalidade e o interesse da população, o MP não pediu a saída da Organização Social (O.S.) denominada CADESP, mas apenas a adequação dos contratos em vigor e a realização do processo seletivo previsto em lei, para novas contratações com a mesma O.S. ou com outras. Enquanto isso não se completa, o CADESP deverá permanecer onde está. 

4. A liminar não obsta que todos os repasses necessários ao pagamento integral da folha de pagamentos da maternidade continuem sendo feitos. O que a liminar impede é que a Gota de Leite prossiga pagando ao CADESP valores que caracterizam lucro e que, nos contratos, aparecem  como “taxa de administração”. Entidades do terceiro setor não são empresas; são parceiras. São entidades sem fins lucrativos. Não podem ser remuneradas. Recebem todos os valores necessários à consecução dos seus objetivos (no caso, contratação de pessoal), mas é inadmissível o pagamento de valores extras que, no caso, chegam a 15% dos contratos.

5. Não foram observadas as exigências básicas, previstas em lei, para a contratação do CADESP. Os contratos não foram precedidos de qualquer procedimento de escolha (equivalente a um processo seletivo). Tampouco há parâmetro de comparação para a aceitação dos valores contratados. 

6. O Município não mantém um, mas dois contratos simultâneos com o CADESP. Os valores mensais, somados, são de aproximadamente R$ 1.085.000,00. Significa dizer que, a cada mês, depois de quitar toda a folha de pagamentos dos funcionários e encargos, a entidade que se intitula “sem fins lucrativos” leva dos cofres da Gota cerca de R$ 160.000,00, o que a Promotoria entende, com base em decisões dos Tribunais, que caracteriza lucro. Estima-se que, até fevereiro de 2013, o CADESP embolsou, apenas com base nessa cláusula, cerca de R$ 2.500.000,00 (o total repassado para pagamento de pessoal é superior a 17 milhões e a Promotoria não está questionando o que se gastou a esse título). 

7. A situação atual foi gerada por sucessivas ilegalidades que incluem falta de licitação, contratação de instituição desqualificada (sem a qualificação de O.S. no momento do ajuste), ocultação de contratos, sucessivas prorrogações contratuais (por mais de ano), baseadas em “situação emergencial” (o que a lei proíbe), não realização de concurso público no momento devido, transposição de dinheiro público para a Gota sem autorização legislativa (exigida pela Constituição), falta de prestação de contas etc. 

8. A situação atual foi provocada pela própria Administração que, de forma açodada, em ano eleitoral, reinaugurou a maternidade sem observar as normas legais elementares. Outro TAC feito pelo MP (Promotoria de Direito Humanos), aliás, exigiu que requisitos básicos de estrutura material e humana fossem atendidos, justamente porque também estavam ausentes no momento em que o hospital, às pressas, foi reinaugurado.

 9. Não houve desrespeito ao direito de defesa do Município. A lei prevê, em situações especiais, a concessão de liminares “sem ouvir a parte contrária”, conhecidas como “liminares inaudita altera partes”. A abertura para a defesa é, neste caso, subsequente. A demora da Justiça permitiria, por exemplo, que novos pagamentos indevidos fossem feitos em favor da O.S.

10. A Promotoria de Justiça de Araraquara lamenta profundamente o fato de que as autoridades municipais omitam os seus erros e passem à população uma falsa situação de catástrofe e de paralisação de serviços, provocada pela ação do MP. Envidará esforços para que todos os serviços sejam mantidos, dentro da legalidade, mas não irá compactuar com o enriquecimento ilícito de terceiros. O que foi pago indevidamente deverá retornar aos cofres públicos.



RAUL DE MELLO FRANCO JR.
Promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social de Araraquara

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